90º Aniversário do 18 de Janeiro de 1934
90º Aniversário do 18 de Janeiro de 1934
Uma data histórica e inesquecível na luta dos trabalhadores pela liberdade sindical
No dia 18 de Janeiro de 1934, culminando um processo acidentado de convergência e de constituição de uma frente comum de organizações sindicais, verificou-se uma histórica revolta operária contra a tentativa da ditadura de Salazar de liquidar a liberdade sindical, o direito de greve, a livre negociação colectiva e de impor a fascização dos sindicatos através de um modelo de sindicato único corporativo.
O ano de 1933 foi um ano decisivo na fascização do regime saído do golpe militar de 28 de Maio de 1926 e da institucionalização do chamado “Estado Novo” sob o comando de Salazar. No mesmo ano em que Hitler e o partido nazi tomavam o poder na Alemanha, em Portugal foi criada a Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE), mais tarde denominada PIDE, foi criado o Secretariado da Propaganda Nacional e em Setembro foi publicado o pacote legislativo que estabelecia um edifício social corporativo autoritário, fundado na conciliação de classes, incluindo o Estatuto do Trabalho Nacional inspirado no modelo fascista italiano e a legislação que impunha sindicatos únicos de cariz corporativo controlados pelo regime. O tempo urgia para resistir à ofensiva do regime. Dos 754 sindicatos e associações operárias então existentes, apenas 57 aceitaram a nova legislação que destruía a liberdade sindical. Criaram-se assim condições para a constituição de uma “Frente Única” contra a fascização dos sindicatos, que incluiu a CGT (de orientação anarquista), a Comissão Inter-Sindical (com influência comunista), outras organizações sindicais, e em que convergiram assim comunistas, anarquistas, sectores socialistas e republicanos num movimento que originou a grande revolta operária do 18 de Janeiro de 1934.
Esta revolta, contra a fascização dos sindicatos que o regime de Salazar queria impor, foi também um levantamento popular contra o agravamento das condições de vida e contra o próprio regime. Se a greve geral proclamada para esse dia não se verificou, foram numerosos as acções de protesto e de resistência, as greves e as manifestações. Na Marinha Grande, onde a greve adquiriu grande dimensão e os trabalhadores revoltosos chegaram por várias horas a ocupar e controlar a localidade, mas também houve acções de protesto e greves em Coimbra, Braga, Póvoa de Santa Iria, Chelas, Silves, Barreiro, Seixal, Almada, Alfeite, Cacilhas ou Setúbal. Bento Gonçalves, no seu relatório ao VII Congresso da Internacional Comunista, fala na participação de cerca de 60 000 trabalhadores, número expressivo nas condições da época. A revolta não teve sucesso e a repressão do regime foi violenta e implacável, atingindo duramente as organizações sindicais contestárias e reforçando ainda mais os mecanismos de proibição da greve. Muitos trabalhadores envolvidos nos protestos foram despedidos. No total, ter-se-ão registado 696 prisões e mais de 400 foram submetidos a Tribunal Militar Especial, sofrendo duras penas de prisão e mesmo de degredo. Vários presos acabaram no campo de concentração do Tarrafal, criado em 1936.
Com a derrota desta grande revolta operária, completava-se a fascização do regime. Outro período de resistência social e laboral ao regime começava. Em que vingou nas décadas seguintes a tese do combate no interior dos sindicatos corporativos, como alternativa à clandestinização dos sindicatos. Desse movimento de conquista de sindicatos corporativos por direcções alinhadas com os trabalhadores resultaria a constituição da Intersindical Nacional em 1 de Outubro de 1970 em Lisboa, que teve um importante papel na luta social e política que abriu caminho à Revolução do 25 de Abril.
Para lá da análise histórica das condições então existentes para o desencadear da revolta e para o objectivo incumprido de uma “greve geral revolucionária”, permanece a memória inspiradora do corajoso levantamento dos trabalhadores revoltosos do 18 de Janeiro, que sacrificaram vidas e empregos pela liberdade sindical, pelo direito de greve e pela oposição ao regime fascista da época. A vida e a luta continuaram. E alcançámos em 25 de Abril de 1974, há 50 anos, aquilo a que aspiravam.
A liberdade sindical, o direito de greve e a liberdade de negociação colectiva são hoje fundamentos da democracia e do Estado Social. Não nasceram do nada. Os revoltosos de 18 de Janeiro fazem parte da história da sua conquista. Saibamos honrá-los não deixando enfraquecer estas conquistas e estes direitos. Que, como sabemos, olhando à nossa volta e para o mundo, estão sempre sob ameaça. Saibamos valorizá-los e defendê-los sempre.
Alguma bibliografia sobre a revolta de 18 de Janeiro de 1934:
João Madeira, 18 de Janeiro de 1934 – O Grande Combate do Sindicalismo Livre, no jornal digital Setenta e Quatro – https://setentaequatro.pt/ensaio/18-de-janeiro-de-1934-o-grande- combate-do-sindicalismo-livre
Francisco Canais Rocha, Resenha Histórica do Movimento Operário e do movimento sindical português (1838-1970) in “Contributos para a historia do movimento operário e sindical – Das raízes até 1977”, CGTP-IN, 2011
Maria de Fátima Patriarca, “Sindicatos contra Salazar. A Revolta de 18 de Janeiro de 1934”, Imprensa de Ciências Sociais, 2000.
Henrique Sousa
Seixal, 18 de Janeiro de 2024